Este é um dos fundamentos da nossa Ordem, um dos
alicerces sob os quais ela está baseada. Conceito instituido há alguns séculos
pelo Venerável Dukhatt, um mestre dos primórdios da Ordem, o "Benedictum
et Idum" é o ABENÇOA E PASSA. É
um conceito muito amplo mas em linhas gerais ele prega a necessidade de não
aumentarmos ainda mais o fardo que naturalmente temos de carregar ao longo
da vida e não levarmos conosco rancores e mágoas.
Algo que nos tenha sido feito há muitos anos : ao lembrarmos
daquilo sem ter usado o Abençoa e Passa, vai apenas trazer aqueles
acontecimentos para o momento atual, como se eles estivessem ocorrendo agora.
Sem a barreira do Abençoa e Passa a lembrança daqueles fatos nos liga àquele
momento do passado. a linha do tempo ligará diretamente o momento atual
àquele momento, e trazemos para cá todo o rancor daquele período, exatamente
como se a injúria tivesse acontecido agora. E isso envenena o Espírito.
Não se trata de um perdão, no sentido que se dá a esta palavra geralmente.
É comum que a pessoa diga "eu perdôo mas não esqueço" e nisso reside
o erro, pois que na prática não houve nenhum perdão, ainda que isso fosse
possível.
Certamente que deixar totalmente de lado uma injúria ou injustiça contra nós
cometida é algo difícil, mas que atingirá com maior intensidade quanto maior for
o seu ego. É que toda pessoa que tem um ego muito grande tem uma
"superfície de contato" maior e portanto pode ser ferida com mais
facilidade.
O que você precisa saber é que toda mágoa e todo rancor exerce pressão sobre o
espírito, e serve de âncora que não o deixa seguir adiante. Para qualquer
pessoa que tenha mesmo mínimas ambições de evolução espiritual não pode haver
esse desperdício de potencialidades voltadas a reviver momentos de angústia que
ficaram e devem permanecer no passado. E é particularmente interessante
constatar o quanto as pessoas em geral encontram muito mais facilidade em
reviver mágoas do que reviver momentos felizes. Não lembram muito bem
daquelas ocasiões de grande alegria mas das injúrias lembram com uma
impressionante riqueza de detalhes. E isso as mantém amarradas.
Conhecia uma senhora que tinha uma irmã com a qual não conversava há quase 25
anos, embora morassem na mesma rua. Ao perguntar a razão, imaginando ter
ocorrido um conflito muito sério, a resposta me surpreendeu. Ela disse que
duas décadas atrás havia conhecido um rapaz pelo qual se interessou e parecia
haver reciprocidade, e eis que surgiu a irmã na história. Contou que a
irmã se insinuou e "roubou" o rapaz em questão, tomando-o para si.
Mas, os detalhes : o dito rapaz não era sequer namorado ainda, e sim um
conhecido, e ficou com a irmã apenas por uns 10 dias, depois sumiu.
Mas essa senhora sentiu-se, á época, tão injuriada que brigou com a irmã e desde
então não se falaram mais, e mesmo nos dias de hoje se refere à irmã por
termos pejorativos. Da família só restam elas e mais duas irmãs, e alguns
sobrinhos, mas em qualquer evento familiar onde uma estiver a outra não vai.
Como pode uma coisa absurda dessas ? Um evento momentâneo 25 anos atrás e
criou-se ali um ressentimento muito forte. E o pior é que o tal rapaz logo
depois se revelou um marginal pois quando tiveram notícias dele souberam que
estava preso numa penitenciária de São Paulo depois de um assalto que não deu
certo, embora vários assaltos anteriores tenham se efetivado.
Mas ouvi outros tantos absurdos, como amigas íntimas desde a infância que de um
momento para o outro passam a se odiar porque uma usou uma blusa que era da
outra. O ser humano, de fato, é muito complicado.
Imagine então o que significa manter o coração carregado de ódio contra alguém
durante vários anos, décadas, por causa de algo que já na época carecia de
importância, e hoje não tem relevância alguma : mas o ego ferido não
cicatriza tão rápido, e a tendência das pessoas é manter sempre um ressentimento
a respeito de alguém que em algum momento fez ou deixou de fazer algo que
queríamos. De fato, o ego pode se constituir em um atraso de vida para
nós.
Abençoa e Passa. Reconhece-se que o ser humano é cheio de falhas e
limitações. Retiramos daquele ato injurioso toda e qualquer relevância que
a ele tenhamos atribuído. Ao invés de um ressentimento dirigimos à pessoa
uma benção, e invocamos o Poder Maior como testemunha dessa benção, na qual
nos comprometemos, ante esse testemunho, a liberar esta pessoa de toda e
qualquer mágoa que pudessemos nutrir em relação a ele. Abençoamos e
passamos, seguimos em frente, e não mais pensaremos nisso. Aquele fardo
não mais pesará em nosso espírito, e rompemos ali todo e qualquer laço ou
vínculo nefasto em relação àquela pessoa. É que enquanto há algum
ressentimento haverá um elo nos unindo a essa pessoa, e esse elo nos mantém
atrelados a ela na forma de rancor. Esse rancor vai nos envenenando aos
poucos.