e
me for perguntado "Você é feliz ?" eu
responderei "Graças ao Poder Maior, não
!" Essa resposta, colocada dessa
forma pode a primeira vista parecer um tanto confusa e até mesmo paradoxal mas
ela encerra um dos grandes fundamentos da nossa Ordem quanto às missões do ser
humano desperto e consciente neste mundo.
Para que isso fique melhor explicado vamos ver o que disse o Venerável Mestre
Dukhatt, séculos atrás, a esse respeito :
"
O vulgo, assim como o profano, terão dificuldades imensas em
compreender a lógica aristotélica dessa Doutrina, que está alheia do
sistema de crenças em que ambos vivem. Mas a eles vamos explicar que a
dita Felicidade é o sentimento mais egoísta que pode acometer o ser
humano. " Antes, se faz mister explicar que a Felicidade propriamente dita não é coisa para esse plano de evolução, sendo destinada a outra seara, de bem-aventurança e em outras moradas mas ainda assim pode ser experimentada aqui em raras ocasiões mas por seres muito singulares. " Felicidade é o que os orientais chamam de atingir o Nirvana. O Nirvana é assim definido : estado de suprema euforia ocasionado pela extinção do Ser. A Felicidade-Nirvana é um estado em que você não é, você está. É a anulação, uma fusão entre sua essência e a Grande Essência, de maneiras que você é apartado de tudo, inclusive de si mesmo. Então, nesse estado, você não tem mais utilidade a este plano, pois está agora em profunda e plena euforia por causa dessa extinção do Ser. Isso não é o mesmo que atingir os êxtases espirituais, trata-se de um estado permanente. Torna-se um iluminado, atinge o Budato, e deixa de prestar auxílio aos seus irmãos. Nesse sentido é que foi dito que atingir essa Felicidade seria a coisa mais egoísta que um ser humano poderia fazer. A despeito de tudo isso, a despeito do conceito da real Felicidade, o homem salaz pode achar que Felicidade é usufruir da sua salacidade, assim como todos os outros que acham ser Felicidade o ato de aproveitar as suas ilusões temporais e satisfações dos sentidos, mas não passam de hereges que comparam a Felicidade com o que encontram nesse mundo de Maya."
Ensaística de
Cosmovisão e Imagética |
Então não cometerei a heresia de dizer que sou feliz e nem desejo isso, nem a
mim nem a ninguém. Na verdade, ser feliz, agora, seria a pior coisa que poderia
me acontecer posto que estou engajado em uma missão em relação à
Humanidade. Eu sou contente, eu estou satisfeito, mas feliz não. E desejo
que todos sejam muito contentes e satisfeitos em suas vidas e faço tudo o que
estiver ao meu alcance para que as pessoas consigam.
O feliz se torna um alumbrado, um fascinado, passa a ser alguém que não é
mais desta natureza.
Se dirá que na vida o que há são momentos felizes, mas na verdade eles nem
isso são. Tais momentos são de grande satisfação, mas não são uma
felicidade. É preciso ter em mente que o termo
"felicidade" foi indevidamente apropriado e hoje se vulgarizou
mas ele tem um significado superior.
Por exemplo, o momento do nascimento de um filho : se dirá que é um
momento feliz, mas ocorre que a Felicidade real não se deixa apanhar por apenas
um momento. ela é ou não, ela está ou não está. Não é por um
momento que se manifestará : ela será um estado permanente ou então
não é Felicidade. Assim, nesse caso do nascimento do filho, você se
torna muito satisfeito, eufórico com o fato de ser pai ou mãe, mas esse
sentimento inicial perderá intensidade até desaparecer, quando passará a ser
substituído por outros, tais como apreensão, preocupação, angústia,
decepção e muitos outros, de diferentes naturezas, mas aquele estado de
euforia foi só no início, portanto não é Felicidade.
Buscar a Felicidade é buscar a alienação. Não somos nós quem buscamos
a Felicidade e sim ela quem nos alcança mas em outro plano, não aqui, onde ela
raramente se manifesta justamente para não perturbar a evolução natural deste
plano.
O que nos cabe buscar é a satisfação, é o contentamento, e isso se obtém
até nas pequenas coisas.
Para começar, é preciso parar com essa mentalidade tacanha de só querer fazer
o que gosta. Nem sempre temos essa escolha, muitas vezes trata-se de coisa
compulsória totalmente alheia ao nosso querer mas temos de desempenhar a tarefa
que nos coube. se for com desagrado a pessoa se torna amargurada, então
vamos aprender uma lição das mais importantes e é bom não esquecer : a
pessoa não tem que fazer o que gosta e sim gostar do que faz. Se deu o
acaso dela estar fazendo justamente aquilo que gosta então parabéns a ela mas
isso é uma exceção. Ora, se as pessoas só fossem fazer aquilo de que
gostam ainda estaríamos nas cavernas.
Das pequenas coisas tiramos grandes satisfações. Essas satisfações nos dão
o ânimo, o ímpeto de seguir em frente, cumprirmos nosso papel no mundo, ao
invés de nos limitarmos a um estado egoísta de felicidade íntima que diz
respeito só a nós e não pode ser partilhado.
E tudo feito de forma moderada, ponderada e gradual, onde saboreamos os
momentos. É desse jeito que aprendemos a gostar daquilo que fazemos.
Usaremos um jeito zen de viver e sentir o mundo. Não podemos nem devemos
"viver intensamente" . Ora, quem vive intensamente morre mais
depressa. Veja esse exemplo, que estabelece a diferença entre alguém que
aprecia um bom vinho e uma pessoa que adora vinho. o que aprecia
vinho se torna um conhecedor de bouquets e safras, é um apreciador de paladar
aguçado quanto a variados tipos de vinho. Mas aquele que adora vinho
geralmente se torna um bêbado que costumeiramente bebe bem mais do que devia. O
mesmo se aplica a quem aprecia uma boa mesa e quem adora uma boa mesa. Um
se torna pessoa de paladar refinado, apreciador de sabores. O outro se
torna um glutão que não raro terá inclusive obesidade mórbida. E o que
aprecia o dinheiro e o que adora dinheiro ? Um sabe usar o dinheiro porque
reconhece nele um meio de sanar dificuldades, suas e dos demais, aprende que o dinheiro é uma energia viva que é preciso saber usar corretamente. Mas o
que adora dinheiro se torna um escravo dele, fazendo qualquer coisa por mais e
mais, só pelo prazer de acumular, mesmo que nunca venha a se beneficiar disso.
Sobre o sexo também se aplicam esses mesmos conceitos, assim como o desejo de
trabalhar, que se estiver descontrolado torna o homem um workaholic que irá ao
túmulo bem mais cedo do que deveria.
Aqui esclarecemos que não é nossa pretensão mudarmos a forma de pensar das
pessoas nem tampouco a maneira com que empregam as palavras. As pessoas
podem e devem continuar usando o termo "felicidade" da
forma que melhor lhes aprouver. Nossa parte foi tão somente esclarecer em
que ela realmente consiste e especialmente o que ela não é, mas não vai aqui
nenhuma idéia de mudança nos costumes, sistemas de crenças ou formas de
expressão.
Note-se que até mesmo Aristóteles,
que é o mentor e inspirador da filosofia de Arganthus também fez uso
desse termo, ao definir o conceito de "Guerreiro Feliz" ( que
acabou sendo indevidamente apropriado por alguém que deu o nome de
"Guerreiro da Luz" mas conservou as definições como se fossem suas
quando na verdade são de Aristóteles). Aliás, Aristóteles é a
principal chave para a compreensão da filosofia da Ordem de Arganthus.