omeçarei este capítulo a respeito do Poder Maior fazendo ao meu leitor uma pergunta retórica :  se dizemos que Deus é tudo e está em tudo, por qual razão as pessoas olham para cima quando falam com Deus ?

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                      Não é preciso responder pois como eu indiquei, é só uma pergunta retórica mas que ilustra bem o ponto em que quero chegar.   Mesmo não compreendendo claramente o que seja Deus as pessoas tem um respeito inconsciente por Ele, de maneira que instintivamente procuram por Ele em algum lugar acima, talvez no céu, no espaço, enfim, mesmo não sabendo precisar a razão elas sempre O colocam em uma situação elevada em relação a nós, que somos Suas criaturas.
                      Nossa Ordem tem evitado a conotação religiosa que se dá ao nome "Deus", e assim como as demais Ordens Seculares ela optou pelo termo  "Poder Maior" que é um termo bem mais abrangente e  a-religioso.   Isso é feito porque é preciso que fique claro que a Magia não é uma religião no termo que geralmente se dá a essa palavra.  Ser um sacerdote e prestar culto ao Poder Maior não é o mesmo que prestar culto a um deus específico.
                      O Poder Maior é o Tudo ; é a Essência ; é o Totus ; é o Nous ; é a Quintessência ; enfim, são vários nomes para designar uma mesma coisa, que é a Fonte Primordial de todas as coisas.
                      A todos os estudantes de Magia deixamos bem claro que é preciso ter uma crença num Poder Superior, seja ele qual for, mas é preciso que exista essa crença, que é a base da fé, sem a qual nada se faz.
                      Um dos grandes objetivos da Magia Consciente é a espiritualização do praticante, mas tal coisa será impossível  se ele não tem uma crença em algo acima da sua condição de Ser Humano, pois do contrário ele teria fé apenas na matéria, o que seria um equívoco dos mais lamentáveis em se tratando de algum que trilha um caminho espiritual.
                       O sistema em que estão inseridas as Ordens estabelece o Caminho do Meio :  da mesma forma que é preciso não ser um descrente também é preciso que não se caia no erro da fé cega, pois nada pior do que uma crença irracional.  A crença irracional se caracteriza pela falta de questionamentos, sendo a crença em algo de maneira totalmente incondicional, o que em outras palavras significa fanatismo, onde existe até um temor de pensar em questionar o objeto dessa fé cega.
                       Quanto ao Poder Maior, ele pode ser objeto de investigação íntima, ele pode ser questionado.  Mas é preciso que se saiba que você não pode entender o Poder Maior, mas você pode compreendê-lo, e são duas coisas diferentes.
                        Compreender o Poder Maior significa estar ciente do que Ele é, saber que ele não segue nenhum padrão da lógica humana, é saber que ele está e é em tudo, é compreendê-lo como a Causa e a Conseqüência de todas as coisas visíveis e invisíveis.   Mas tentar entender o Poder maior é outra coisa :  é tentar sondar seus mistérios, é tentar encontrar a chave das suas ações, e isso é algo que está além da capacidade humana.  O Poder Maior não será entendido. Sempre manifestamos a tendência de tentar entender o desconhecido com base nos nossos padrões racionais humanos, repletos das nossas definições pessoais a respeito daquilo que achamos ser o mais adequado, mas ignoramos que isso não pode se aplicar aquilo que transcende todo o nosso  sistema lógico.  Deparar-se com algo que não pode ser definido nem explicado pelos nossos padrões é de fato uma experiência impressionante mas a tentativa de classificar  Deus se constitui também numa demonstração de  falta de humildade e é por esta razão que as Ordens não tentam entender o Poder Maior mas sim compreende-Lo e operar com Ele.
                         Para uma melhor compreensão, observe esses exemplos :

Exemplo do que é :
Certo Compreender o Poder Maior  " Isto está nas mãos de Deus. "
Errado Tentar entender o Poder Maior "Por quê Deus permite essas coisas ?"


                         Por que indiquei como "Certo"  Compreender o Poder Maior :   porque a nós, criaturas, não nos cabe rebelar-se contra a ordem natural das coisas e temos de aceitar aquilo que não está sujeito à nossa vontade.  Por exemplo, a morte de um ente querido é sempre algo trágico mas não controlamos esse tipo de evento, que obedece a um desígnio que está além das nossas sondagens e capacidade de aceitação. Certamente que se nos fosse dada capacidade e poder para interferir nesse tipo de questão nós perverteríamos a ordem natural e impediríamos que a morte atingisse nossos parentes e amigos, além de nós mesmos, e a concessão desse poder a nós  seria algo extremamente injusto para com aqueles que não receberam a mesma capacidade. Por isso a Justiça Divina trata dessas questões sem nos consultar e a nós  não  é dado fazer  rebelião a respeito. O mais certo nesse caso é aceitar que o Poder Maior está agindo segundo sua lógica e essa lógica não precisa ser compreensível a nós.   Não, leitor, não pense que estou pregando o conformismo :  estou apenas explicando que vivemos num mundo criado pelo Poder Maior e que Ele estabeleceu as regras, portanto precisamos viver de acordo com elas.

                       Por que indiquei como "Errado"  Tentar entender o Poder Maior :  note, leitor, que eu escrevi "tentar entender" , para que fique claro que tal coisa seria apenas uma tentativa vã, posto que a mente humana não pode entender a grandiosidade do Poder Maior.  Mas a tentativa em si já denota uma falta de humildade bem típica da espécie humana.  Me refiro não à investigação da natureza de Deus porque isso sempre foi tema recorrente entre filósofos e teólogos.  Eu me refiro ao QUESTIONAMENTO das decisões divinas, como destaquei no quadro acima onde Deus está sendo questionado sobre suas razões e motivos, como se Ele devesse satisfações às suas criaturas a respeito de seus planos quanto a elas.  Então, para ficarmos bem entendidos, não é  errado elaborar  teorias  sobre o que é Deus, mas é errado questionar suas motivações, e ainda mais errado dizer que o Poder Maior foi injusto por ter permitido isso ou aquilo. A bem da verdade, a maior parte das situações em que a revolta fala mais alto em nosso íntimo e culpamos o Poder Maior por coisas ocorridas aqui, por exemplo, no caso de atentados terroristas que matam centenas de pessoas, nos esquecemos de que essas coisas foram provocadas por nós e não mandadas por Ele.  Na verdade a nossa ignorância faz com que primeiro sejamos os agentes causadores das situações ruins e quando elas de fato se manifestam o nosso comodismo  faz com que arranjemos um culpado, que pode ser qualquer um menos nós, e nesse caso o Poder Maior serve bem a esse papel.  Usamos nossa parca inteligência para culpá-lo ainda mais, onde dizemos coisas como  "Mas se Ele é assim tão poderoso por que então não impediu aquele atentado que matou tanta gente ?"    Esse tipo de pensamento é como que um atestado da nossa ignorância, que faz com que não vejamos  ( ou não queiramos ver )  que existem Leis que nem Ele mesmo viola, dentre as quais o livre-arbítrio. Assim, veja que o respeito que o  Poder Maior  tem por nós, suas criaturas,  é infinitamente mais completo  do que o respeito que temos por Ele, que é o Criador.

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                     O Poder Maior passou a ser algo distante porque nos desacostumamos de conversar com Ele. 
                     Um dia  falei com uma pessoa que me disse que se o Poder Maior criou e mantém o Universo e administra tantas galáxias e aglomerados  então não seria possível que Ele pudesse dar atenção às preces dela,  já que tinha coisas em escala cósmica para fazer.
                     Mas vamos ver o caso  do nosso cérebro, por exemplo :  ele administra todo nosso corpo, tem que manter o coração batendo, não se descuida do sistema respiratório, circulatório, etc., mas mesmo assim o cérebro sabe o que está havendo com aquela célula na ponta do dedão do pé.  Ele sabe se ela precisa de nutrientes, se ela está doente ou se está tudo bem com ela.  E como o cérebro sabe disso ?  Ele sabe disso porque ele "ouviu"  aquela célula.  A célula mandou um comunicado, e o cérebro ouviu o que ela tinha a dizer.  Não parece incrível que um mecanismo fabuloso como o cérebro, que tem todas as atribuições que ele tem consegue tomar conhecimento da situação de uma única célula no ponto mais afastado do corpo ?   Isso é muito interessante mas verdadeiro.  Agora, se reconhecemos ser possível isso num mero cérebro, por qual razão seria impossível que o Poder Maior, mesmo com todas as funções administrativas do Universo possa tomar conhecimento da situação individual de cada uma das suas criaturas ?  Afinal, se Ele permite que suas criaturas tomem conhecimento das coisas que ocorrem mesmo nas  regiões celulares mais distantes de seus corpos, então porque seria incrível que o Poder Maior procedesse de forma idêntica mesmo para com suas menores criaturas ?  É essa complexidade que faz com que para muitos de nós seja difícil assimilar esses atributos do Poder Maior.

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                   Uma das coisas mais grotescas que podemos fazer é dar ao Poder Maior uma forma.
                   Dentro da Ordem de Arganthus os estudos a respeito do Poder Maior são assuntos hieráticos, que a Ordem lida com  ethos, e para isso usamos um recurso chamado Imagética, pelo qual, resumindo, não ficamos nos perdendo em fantasias quanto a formas, especialmente em coisas descabidas como o culto a um Deus antropomórfico, que para nós é uma aberração.
                   Não achamos que  "E Deus disse :  façamos o homem conforme a nossa imagem e semelhança".  (Aliás, esse "nossa imagem"  é uma bela discussão teológica a respeito da natureza desse plural, só usado duas vezes em toda a Bíblia ).  Na nossa Ordem achamos que o mais correto seria  "E o Homem disse: façamos Deus conforme a nossa imagem e semelhança."   Afinal, para o Homem não bastou estar ciente da existência de um Poder Maior, foi preciso humanificar esse Poder Maior, dando-lhe atributos humanos e até uma forma, humana também.  E essa tendência da divindade antropomórfica se tornou coisa comum em muitas religiões e culturas, nas sérias e nas nem tanto, e aí apareceram coisas que chegaram ao requinte de atribuir até mesmo um sexo a esse Deus antropomórfico, e  surgiram inclusive aquelas fantasias sobre uma Deusa, o que é algo a não se levar a sério, tanto quanto o caso do Deus masculino.
                    O Poder Maior simplesmente É.   Chamo a atenção do meu leitor para que não deixe escapar essa sutileza :   O Poder Maior NÃO ESTÁ em tudo.  O Poder Maior  É em tudo.   Entre essas duas frases existe uma diferença abissal, sobre a qual convido o leitor a refletir.
                    Também devemos ter em mente que o Poder Maior não é o gênio da lâmpada, que está aí para atender aos nossos pedidos, que, diga-se de passagem, quase sempre são egoístas e materialistas.  Há pessoas que buscam a Deus unicamente para pedir  favores, a que chamam de  "graças" , e essas ditas "graças"  quase sempre se referem a coisas materiais, notadamente dinheiro.  E  ainda há aqueles que se atrevem a tentar barganhar, onde dizem a Deus que se Ele lhes conceder determinada coisa ou quantia aí elas vão ser boazinhas, caridosas e outros quetais, talvez imaginando que o Poder Maior possa ser corrompido e que Ele se importa se a pessoa será boazinha ou malvada.  Pode parecer uma coisa simplória mas de fato há pessoas assim, e eu conheço pelo menos quatro delas.
                     Infelizmente são bem poucas as pessoas que buscam Deus como parte de seu caminho espiritual.  Há uma passagem bíblica que diz  "Buscai primeiro o Reino dos Céus, e todo o resto vos será acrescentado" ,  mas algumas pessoas acham que pode haver um atalho onde se pode barganhar a concessão de favores mas sem buscar a espiritualidade, ou seja, querem se aproximar de Deus não como por anseio de ascese espiritual mas apenas para pedir-Lhe coisas mundanas.
                       

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